Ex-executivo de empresa investigada pela PF, Djalma Silva conta como funciona o esquema de fraudes com a Prefeitura de São Paulo. E diz que o fornecimento dos kits de uniformes envolve pagamento de propina acertada por Alexandre Schneider
Claudio Dantas Sequeira
"Acertamos 4%. Isso foi negociado pelo Schneider, vice do Serra"
MEDO
Djalma Silva não quer mostrar o rosto porque teme por sua integridade física
Empresário de 42 anos, natural de Pindamonhangaba (SP), Djalma S. Silva trabalhou por mais de um ano na Diana Paolucci, empresa investigada pela Polícia Federal e pelo Ministério Público por integrar um cartel de fornecedoras de uniformes para escolas da rede pública. A Diana Paolucci chegou a ser proibida, por 11 meses, de firmar contratos com a Prefeitura de São Paulo. Com salário fixo de R$ 10 mil e uma comissão de 30%, Djalma era diretor-comercial da companhia e tinha a tarefa de abrir portas no poder público. Foi nesta condição que ele participou de reuniões e negociatas que tentavam ampliar a participação da Diana Paolucci no mercado de fornecimento de kits escolares. Agora Djalma está fora da empresa e diz que se desligou por não concordar com os métodos adotados durante a negociação dos contratos. Na quarta-feira 15, Djalma Silva recebeu a reportagem de ISTOÉ. Em entrevista exclusiva, resolveu escancarar o funcionamento do submundo da máfia dos uniformes em São Paulo, denunciada pela revista em sua última edição.
De acordo com o empresário, que pediu para não mostrar o rosto, temendo colocar em risco sua integridade física, o esquema não apenas está ativo como envolve o pagamento de propina para integrantes da Prefeitura de São Paulo. O relato compromete o candidato a vice na chapa de José Serra à Prefeitura de São Paulo, Alexandre Schneider. Segundo revelou ISTOÉ na reportagem da última semana, Schneider deu aval para a atuação da máfia no período em que ocupou a Secretaria da Educação. Na entrevista, Djalma foi além. Disse que o grupo de empresários estava preocupado com o avanço do candidato Celso Russomanno (PRB) nas pesquisas de intenção de voto. Já a vitória de José Serra seria, segundo ele, a garantia de que o esquema continuará em pleno funcionamento. “Acertamos (uma comissão de) 4%. Se o Serra ganhar, você paga isso; se for o Russomanno, tem que renegociar. Aí tem que fazer um novo processo. Isso foi negociado pelo Alexandre Schneider, vice do Serra, e Julio Manfredini”, disse Djalma.
ENROLADO
Alexandre Schneider, vice de Serra, teria negociado comissão
Julio Manfredini é proprietário da empresa Capricórnio, uma das investigadas pela PF e o MP por formação de cartel. Segundo Djalma, o percentual de 4% foi revelado em reunião no dia 8 de agosto. Nesse dia, os empresários se reuniram para discutir o impacto da eleição municipal nos negócios do grupo, precisamente a renovação dos contratos de fornecimento de uniformes e material escolar, que somam mais de R$ 140 milhões. O encontro ocorreu no café de um hotel a poucos metros da Coordenadoria dos Núcleos de Ação Educativa (Conae), órgão responsável pelas licitações da secretaria. Quem conduziu a conversa, segundo Silva, foi Eldo Castello Umbelino, dono da Nilcatex, fornecedora de uniformes. Ele contou que vinha de uma reunião anterior com Julio Manfredini e que ele estaria muito preocupado que a vitória de Russomanno atrapalhasse as pretensões do grupo. O bate-papo entre os empresários foi gravado pelo ex-executivo da Diana Paolucci e encaminhado ao Ministério Público.
O empresário se diz arrependido de ter integrado o esquema, conta que começou a atuar na área de licitações de merenda escolar há quase dez anos e, a partir de 2008, resolveu ampliar sua atuação para outros insumos. À reportagem, Djalma Silva apresentou cópias de denúncias protocoladas por seu advogado junto aos gestores públicos e órgãos de controle, alertando sobre as fraudes nos editais e a combinação de preços entre as empresas, antecipando até o resultado de licitações. Desde então, diz que vem sofrendo perseguições e ameaças de morte contra si e sua família. “Um dia desses me enviaram um envelope com a foto do meu filho saindo da escola. Era um recado claro”, afirma.
NEGOCIATA
Segundo testemunha, vitória de Serra é garantia de manutenção do esquema
Um dos que o teria ameaçado seria seu ex-patrão, Abelardo Paolucci. “Ele disse que vai acabar comigo, que é mais bandido do que eu imagino. Eu gravei tudo”, diz. Silva espera assinar nos próximos dias um acordo com o Ministério Público e avalia pedir proteção policial. De fato, o executivo tornou-se uma testemunha-chave. Segundo ele, o esquema foi implementado por Serra ainda no governo do Estado e importado para a Prefeitura paulistana, onde operou desde 2006 pelas mãos do secretário Schneider, que deixou o cargo justamente para concorrer como vice na chapa tucana. Tanto em nível municipal como no estadual, o esquema seria coordenado pela empresa Capricórnio. De acordo com Djalma Silva, Manfredini, o dono da empresa, mantém relação estreita com Schneider. “Ele tem acesso aos editais com antecedência, faz as alterações para beneficiar o seu grupo de empresas. Combinam preços e pagam comissões aos políticos”, afirma Silva. Esses pagamentos, acrescentou a testemunha, ocorreriam em restaurantes na via Dutra e no escritório da Capricórnio na avenida Angélica, em Higienópolis.
Essas empresas, na semana passada, saíram a público para rejeitar as denúncias publicadas por ISTOÉ. Em “informe publicitário” nos jornais de São Paulo, a Diana classificou de “inverídicas” as informações. Documentos entregues por Silva ao Ministério Público, porém, mostram o contrário. São cópias de e-mails e mensagens de celular trocadas com os empresários e políticos envolvidos no esquema. Esses documentos mostram, por exemplo, a negociata entre o ex-diretor da Diana Paolucci e Ortiz Júnior, que é candidato a prefeito de Taubaté pelo PSDB e filho do presidente da Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE), José Bernardo Ortiz.
ACERTO
Ortiz Júnior, candidato a prefeito de Taubaté, pediu comissão
O órgão é responsável por todas as licitações do governo de São Paulo na área da educação e possui orçamento de quase R$ 3 bilhões. Falando em nome do pai e usando sua influência de cacique tucano, Júnior teria procurado Djalma Silva no ano passado para levantar recursos para sua campanha. “Ele queria R$ 7 milhões e pediu 10% do contrato. Consegui 5%”, lembra. A oferta de Júnior incluía, segundo Silva, milionários contratos para fornecimento de mochilas e uniforme escolar. Na semana passada, Manfredini e Schneider foram procurados por ISTOÉ, mas não se pronunciaram até o fechamento desta edição.
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